Sobre quem somos e sobre o que dizem que somos

o que revelam os rituais das Comissões de Heteroidentificação?

Visualizações: 502

Autores

DOI:

https://doi.org/10.20336/rbs.902

Palavras-chave:

ação afirmativa, igualdade racial, comissões de heteroidentificação, acesso ao ensino superior, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Resumo

Uma das recentes práticas relacionadas à implementação de políticas de ação afirmativa direcionadas à promoção de equidade racial é a instauração das Comissões de Heteroidentificação Racial. Tais comissões foram incorporadas como etapa regular necessária em diferentes processos de acesso a instituições públicas, desempenhando o papel de validação do pertencimento étnico‑racial de um candidato e, consequentemente, de verificação de legitimidade para a ocupação de vaga destinada a grupos étnico‑raciais. Este trabalho tentou responder à seguinte pergunta: quais interferências se apresentam no momento da aferição do pertencimento racial promovida pelas comissões de verificação? Para tanto, foi utilizada abordagem metodológica multidimensional: em um primeiro nível, com análise documental, observação dos procedimentos de operação das comissões e observações produzidas a partir da participação em curso de preparação para integrantes das comissões; e em um segundo nível, com entrevistas semiestruturadas direcionadas a agentes institucionais envolvidos com o processo de aferição. Como resultado, a partir da análise do modelo implementado para o acesso à graduação na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, argumentamos que a elaboração da alteridade desencadeada durante as entrevistas reproduz, ritualisticamente, dinâmicas de poder e conflito que i) revelam a existência de tensão entre a objetividade dos procedimentos e a subjetividade da avaliação e ii) propiciam a atualização da discussão sobre o sistema de classificação racial, até então considerado superado para o debate sobre as relações raciais no Brasil.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Andréa Lopes da Costa Vieira, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Professora Associada no Departamento de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Doutora em Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro.

Ludmila Maria Moreira Lima, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Doutora em Antropologia Social pela Universidade de Brasília e professora associada na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro-UNIRIO.

Luma Done Miranda, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Doutoranda em Ciências Sociais na Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Referências

Azevedo, Thales de. (1955). As Elites de Côr. Um estudo de ascensão social. Companhia Editora Nacional.

Batista, Neusa C., & Figueredo, Hodo Apolinário C. de. (2020). Comissões de heteroidentificação racial para acesso em universidades federais. Cadernos de pesquisa, 50(1), 865-881.

Blackman, Ana Elisa de C. (2014). Lei de Cotas: idas e vindas do debate sobre o acesso ao ensino superior – um estudo de caso da UnB [Monografia de Especialização em Gestão de Política Públicas em Gênero e Raça, Universidade de Brasília]. https://bdm.unb.br/handle/10483/12873

Brasil. (2012, 29 ago.). Lei nº 12.711/12 (Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências). Presidência da República.

Brasil. (2017). Ação declaratória de constitucionalidade n. 41 (Relator Min. Roberto Barroso, Direito constitucional. Ação direta de constitucionalidade. Reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da lei n° 12.990/2014. Procedência do pedido). Supremo Tribunal Federal.

Braga, Alexandre F. (2021). As bancas de heteroidentificação racial: apontamentos a partir da experiência da UFMG. Revista em Favor de Igualdade Racial, 4(2), 3-16. https://doi.org/10.29327/269579.4.2-2

Campos, Luiz A. (2013). O pardo como dilema político. Insight Inteligência, (63), 80-91.

Carvalhaes, Flavio, & Ribeiro, Carlos Antônio C. (2019). Estratificação horizontal da educação superior no Brasil: Desigualdades de classe, gênero e raça em um contexto de expansão educacional. Tempo Social, 31(1), 95-233. https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2019.135035

Carvalho, José Jorge de. (2020). Autodeclaração confrontada e punição nas fraudes: os avanços da igualdade racial na era das cotas. REPECULT-Revista Ensaios e Pesquisas em Educação e Cultura, 5(9), 45-67.

Daflon, Verônica, Carvalhaes, Flávio, & Feres Júnior, João. (2017). Sentindo na pele: percepções de discriminação cotidiana de pretos e pardos no Brasil. Dados, 60(2), 293-330. https://doi.org/10.1590/001152582017121

Dias, Lucimar, Moreira, Laura, & Freitas, Ana Elisa. (2019). A experiência da Universidade Federal do Paraná nos processos de bancas de validação de autodeclaração. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 115-135.

Elísio, Régis, Costa, Antônio Cláudio, & Rodrigues Filho, G. (2019). Histórico e Desafios no Processo de Implementação das Comissões de Heteroidentificação na Universidade Federal de Uberlândia. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 41-56.

Fonseca, Maria, & Costa, Thiala. (2019). As comissões de aferição de autodeclaração na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia-UFRB. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11, 94-114.

Goffman, Erving. (1989). A Representação do Eu na Vida Cotidiana. Vozes.

Feres Júnior, João, Daflon, Verônica, & Campos, Luiz Augusto. (2011). A ação afirmativa no ensino superior brasileiro (Levantamento das políticas de ação afirmativa GEMAA). IESP-UERJ.

Ferreira, Lígia. (2020). Narrativas minhas, deles, delas, dels, enfim, nossas: escrevivências da heteroidentificação na Universidade Federal de Alagoas. REPECULT-Revista Ensaios e Pesquisas em Educação e Cultura, 5(9), 145-158.

Freitas, Matheus, & Sarmento, Rayza. (2020). As falas sobre a fraude: análise das notícias sobre casos de fraudes nas cotas raciais em universidades em Minas Gerais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(1), 271-294.

Foucault, Michel. (1992). Microfísica do Poder. Graal.

Foucault, Michel. (1984). Deux essaissurlesujet et lepouvoir. In F. Humbert & P. Rabinow (org.), Michel Foucault : un parcoursphilosophique (pp. 297-321). Gallimard.

Guimarães, Antonio Sérgio, Rios, Flávia, & Sotero, Edilza. (2020). Coletivos Negros e novas identidades raciais. Novos estudos CEBRAP, 39(2), 309-327. https://doi.org/10.25091/s01013300202000020004

Hasenbalg, Carlos, Silva, Nelson do V., & Lima Márcia. (1999). Cor e estratificação social . Contra Capa.

Leach, Edmond. (1976). Sistemas Políticos de la Alta Birmânia. Anagrama.

Lima, Ludmila. (2004). Diálogo intercultural e participação indígena no PPTAL. Revista Anthropológicas, VIII(15-2), 85-106.

Lima, Ludmila. (2002). Cooperação e parceria no contexto de um projeto piloto: a experiência do PPTAL. In A. Souza Lima (org.), Gestar e gerir: para uma antropologia da administração pública no Brasil. Relume-Dumará.

Loveman, Mara, Muniz, Jeronimo, & Bailey, Stanley. (2011). Brazil in black and white? Race categories, the census, and the study of inequality. Ethnic and Racial Studies, 35(8), 1466-1483. https://doi.org/10.1080/01419870.2011.607503

Maciel, Carina E., Teixeira, Samanta, & Santos, Lourival. (2019). Política de cotas e bancas de heteroidentificação na UFMS: uma história em construção. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 78-93.

Magalhães, Rosélia P. de, & Menezes, Simone C. (2014). Ação afirmativa na UFRJ: a implantação de uma política e os dilemas da permanência. O Social em questão, XVII(32-1), 59-74. https://doi.org/10.14393/REPOD-v11n1a2022-64907

Maia, Giovanna F. & Vinuto, Juliana. (2020). A seleção via cotas raciais em universidades públicas: debates sobre as Comissões de Verificação da Autodeclaração de Raça. Revista Contraponto, 7(1), 26-49.

Maio, Marcos Chor, & Santos, Ricardo V. (2005). Política de cotas raciais, os “olhos da sociedade” e os usos da antropologia: o caso do vestibular da Universidade de Brasília (UnB). Horizontes antropológicos, 11(23), 181-214. https://doi.org/10.1590/S0104-71832005000100011

Marques, Eugenia, Rosa, Aline, & Oliveira, Fabiana. (2019). Políticas afirmativas em curso na Universidade Federal da Grande Dourados e a implantação da Comissão Geral de Heteroidentificação. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 57-77.

Mello, Daniel. (2021, 7 jul.). USP investiga 193 denúncias de fraude no sistema de cotas raciais. Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2021-07/usp-investiga-193-denuncias-de-fraude-no-sistema-de-cotas-raciais

Ministério Público Federal. (2018, 12 mar.). MPF/RJ quer adoção de controle prévio para ingresso nas cotas raciais em universidades públicas. Ministério Público Federal. http://www.mpf.mp.br/rj/sala-de-imprensa/noticias-rj/mpf-rj-quer-adocao-de-controle-previo-para-ingresso-nas-cotas-raciais-em-universidades-publicas

Miranda, Ana Paula M. de, Souza, Rolf R. de & Almeida, Rosiane R. de. (2020). “Eu escrevo o quê, professor (a)?”: notas sobre os sentidos da classificação racial (auto e hetero) em políticas de ações afirmativas. Revista de Antropologia, 63(3), e178854. https://doi.org/10.11606/1678-9857.ra.2020.178854

Moreira, Matheus. (2020, 16 ago.). Denúncias de fraudes em cotas raciais levaram a 163 expulsões em universidades federais. Folha de São Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2020/08/denuncias-de-fraudes-em-cotas-raciais-levaram-a-163-expulsoes-em-universidades-federais.shtml

Muniz, Jeronimo O. (2016). Inconsistências e consequências da variável raça para a mensuração de desigualdades. Civitas-Revista de Ciências Sociais, 16(2), e62-e86. https://doi.org/10.15448/1984-7289.2016.2.23097

Nogueira, Oracy. (1954, 23-28 ago.). Preconceito racial de marca e preconceito racial de origem: Sugestão de um quadro de referência para a interpretação do material sobre as relações raciais no Brasil [Apresentação de artigo]. XXXI Congresso Internacional dos Americanistas (Anais, pp. 406-434), São Paulo.

Nunes, Georgina H. (2019). Comissão de Heteroidentificação da Universidade Federal de Pelotas: um enfoque sobre as ações afirmativas em curso na região sul/Rio Grande do Sul. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 159-173.

Nunes, Georgina H. (2018). Autodeclarações e comissões: Responsabilidade procedimental dos/as gestores/as de ações afirmativas. In G. Dias & P. Junior, Heteroidentificação e cotas raciais: dúvidas, metodologias e procedimentos. IFRS.

Passos, Joana C. dos. (2019). A atuação da Comissão de Validação de Autodeclarados negros na UFSC: uma experiência político-pedagógica. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 136-158.

Peres, Edis H. (2021, 23 mar.). Fraude em cotas: UnB avalia 90 denúncias e puniu 25 alunos em 2020. Correio Braziliense. https://www.correiobraziliense.com.br/euestudante/ensino-superior/2021/03/4913630-fraude-em-cotas-unb-avalia-90-denuncias-e-puniu-25-alunos-em-2020.html

Rios, Roger R. (2018). Pretos e pardos nas ações afirmativas: desafios e respostas da autodeclaração e da heteroidentificação. In G. Dias & P. Junior, Heteroidentificação e cotas raciais: dúvidas, metodologias e procedimentos. IFRS.

Rodrigues, Gabriela M. B. (2022). Incorporando a mestiçagem: a fraude branca nas comissões de heteroidentificação racial. Horizontes Antropológicos, 28, 307-331.

Picanço, Felícia, & Morais, Juliana. (2016). Estudos sobre estratificação educacional: síntese dos principais argumentos e desdobramentos. Educação & Sociedade, 37(1), 391-406.

Santos, Adilson P. dos, Camilloto, Bruno & Dias, Hermelinda G. (2019). A heteroidentificação na UFOP: o controle social impulsionando o aperfeiçoamento da política pública. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), 11(29), 15-40.

Dos Santos, Adilson, Teodoro, Paula, & Ferreira, Lígia. (2020). Um panorama das comissões de heteroidentificação étnico-racial: reflexões do II seminário nacional. REPECULT-Revista Ensaios e Pesquisas em Educação e Cultura, 5(9), 68-85.

Santos, Sales A. dos. (2021). Comissões de heteroidentificação étnico-racial: lócus de constrangimento ou de controle social de uma política pública? O Social em Questão, 50(1), 11-62.

Santos, Sales A. dos & Freitas, Matheus S. (2020). Sistema de cotas e fraudes em uma universidade federal brasileira. REVES-Revista Relações Sociais, 3(3),1- 23. https://doi.org/10.18540/revesvl3iss3pp0001-0023

Santos, Washington dos. (2001). Dicionário jurídico brasileiro. Del Rey.

Souza, Jessé. (1997). Multiculturalismo e racismo: uma comparação Brasil e Estados Unidos. Paralelo 15.

Souza Lima, Antonio Carlos de. (1995). Um grande cerco de paz. Poder tutelar, indianidade e formação do Estado no Brasil. Ed. Vozes.

Souza Lima, Antonio Carlos de (org.). (2002). Gestar e Gerir: estudos para uma antropologia da administração pública no Brasil. Relume Dumará.

Silva, Ana Claudia, Cirqueira, Diogo M., Rios, Flavia, & Alves, Ana Luiza M. (2020). Ações afirmativas e formas de acesso no ensino superior público: o caso das comissões de heteroidentificação. Novos estudos CEBRAP, 39(1), 329-347. https://doi.org/10.25091/s01013300202000020005

Silva, Graziella, & Leão, Luciana T. S. (2012). O paradoxo da mistura: identidades, desigualdades e percepção de discriminação entre brasileiros pardos. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 27(80), 117-225. https://doi.org/10.1590/S0102-69092012000300007

Silva, Graziella M., & Saldivar, Emiko. (2018). Comparing ideologies of racial mixing in Latin America: Brazil and Mexico. Sociologia & Antropologia, 8, 427-456. https://doi.org/10.1590/2238-38752017v824

Silva, Nelson do V. da. (1999). Uma nota sobre raça social no Brasil. In C. Hasenbalg, N. Silva, & M. Lima. Cor e estratificação social (pp.107-125). Contra Capa.

Vieira, Andréa L. da C. (2003). Políticas de educação, educação como política: observações sobre a ação afirmativa como estratégia política. In P. Silva & V. Silvério (org.), Educação e ações afirmativas: entre a injustiça simbólica e a injustiça econômica (83-97). INEP.

Wickbold, Christiane C., & Siqueira, Vera. (2018). Política de cotas, currículo e a construção identitária de alunos de Medicina de uma universidade pública. Pro-Posições, 29(1), 83-105. https://doi.org/10.1590/1980-6248-2016-0153

Downloads

Publicado

02/02/2023

Como Citar

Costa Vieira, A. L. da, Moreira Lima, L. M., & Done Miranda, L. (2023). Sobre quem somos e sobre o que dizem que somos: o que revelam os rituais das Comissões de Heteroidentificação?. Revista Brasileira De Sociologia - RBS, 10(26). https://doi.org/10.20336/rbs.902